Editorial |
LUZ!CÂMERA...CANÇÃO!
- Por Sergio Luiz
“Era o ano de 1962. Os
adolescentes dançavam no Peppermint Lounge.O astronauta americano Glenn orbitava
o planeta. Wilt Chamberlain marcava cem pontos em um único jogo. E Elvis
avaliava suas chances com as Garotas!Garotas!
Garotas!”
Por mais incrível que possa
parecer, é assim que a própria Paramount Pictures posiciona historicamente o
filme Girls! Girls! Girls! na contracapa nacional do DVD de mesmo nome. E
infelizmente, a Paramount apenas confirma uma triste realidade, embora contrária
ao que se espera – e provavelmente fosse o intuito- de uma campanha
publicitária.
O outrora rebelde de uma geração,
a pedra fundamental de um movimento cultural que viria a moldar novos costumes e
modificar para sempre a história da música estava agora relegado a filmes
“praianos”, cercados de garotas e mais garotas.
Aparte de seus filmes iniciais,
E não há como negar que existem motivos suficientes para passar o “fast forward” nessa parte de sua carreira, afinal de contas durante os últimos anos em que estrelava essas “pérolas” da sétima arte, movimentos musicais surgiam e influenciavam gerações com seus sons psicodélicos. O Rock ´n ´Roll crescia, se tornava um adulto que lidava com assuntos mais complexos do que o cinema com pipoca e o beijo na garota de batom rosa, no escurinho do estacionamento.
E frente a tudo isso, Presley se
refugiava nos filmes, entediado, frustrado e soterrado por quilos de maquiagem,
coisa que sempre detestou.
É fácil também, diante de tantos
aspectos negativos, esquecer que os filmes da chamada “Fórmula Presley” tinham um propósito e como tal, o
atingiram com perfeição.
Eles existiam somente por um
motivo, e por mais absurdo que possa parecer, o eram assim porque assim desejava
seu público.
Após seu retorno do exército com a
estréia de G.I. Blues, a imagem de Presley seria radicalmente transformada de
rebelde para o “entertainer” família.
Susan Doll, pesquisadora e autora
do livro “ The Films Of Elvis Presley” comenta:
“Aproveitando a boa publicidade
adquirida com sua passagem pelo exército, o Coronel lançou uma nova imagem, mais
“limpa”, para Elvis. As costeletas, que a imprensa achava tão ofensivas, e as
roupas chamativas e arrojadas eram agora coisa do
passado”
Rebelde X Bom moço
Todas essas mudanças objetivavam
aumentar o alcance público de Elvis, atingindo não somente os filhos, mas seus
pais também. Sobre todos os aspectos, com exceção da relevância artística, essa
foi uma decisão enormemente correta.
Seus filmes passaram a ser
veículos de entretenimento saudável e divertido para toda a família, ao
contrário de filmes anteriores que convidavam os jovens a contestação
e a rebeldia.
Elvis entretanto, não concordava
com essa mudança. Não era este o desejo por ele alimentado tantos anos, quando
sonhava acordado dirigindo um caminhão em Memphis.
Para o garoto que assistia James
Dean rebelar-se sem causa e Brando em sua motocicleta selvagem, cantar com
fantoches para crianças mostrava-se uma tarefa morosa e sem
desafios.
Tentativas foram feitas para dar a Elvis o que ele queria. Essas tentativas se manifestaram através dos filmes Wild In The Country e Flaming Star.
Ambos apresentavam Elvis num papel
desafiador, com personagens mais obscuros e complexos, geralmente atormentados
por fantasmas íntimos.
Neles, é possível ver o brilho de
um diamante a ser lapidado. Não há dúvidas que junto a King Creole e Jailhouse
Rock, estes filmes mostraram o potencial de Elvis para o drama.
Fatalmente, quis o destino que
esse potencial bruto jamais fosse explorado. Os raios de sol e o clima
paradisíaco de Blue Hawaii, eclipsaram toda e qualquer chance de uma carreira
séria no cinema para Elvis.
Arrecadando milhões em sua
bilheteria inicial e alçando ao posto mais alto sua trilha sonora, Blue Hawaii
selou o destino de Elvis no cinema: Comédias românticas, preferencialmente em
locais paradisíacos, cercado de belas garotas e muitas
canções.
E embora Wild In The County e
Flaming Star tenham sido sucessos de bilheteria, a performance de Blue Hawaii
nos cinemas, e nos bolsos do Coronel, da Paramount e de Elvis, serviu como
argumento definitivo para que desistisse dos filmes
sérios.
Outros filmes viriam, todos
adotando a formula Presley: Girls!
Girls! Girls! Fun In Acapulco! Kissin Cousins e Girl Happy são exemplos desse
padrão.
Nada haveria de errado nessa
lógica, afinal os filmes atingiam bilheterias enormes, e principalmente
satisfaziam o apetite do público por Elvis.
Sob um aspecto, os filmes de Elvis na década de 60 foram responsáveis pelo aumento de sua fama ao redor do mundo, uma vez que esse tipo de mídia tinha alcance global e seu apelo perante público não americano era maciço.
No Brasil por exemplo, seus filmes
lotavam as salas de cinema, sempre adornadas com cartazes brilhantes de seus
recentes lançamentos. Revistas como a Cine-fan e Filmelândia reproduziam o filme
na íntegra, com fotomontagens e dialogo resumido. Era comum que o publico fosse
às salas repetidas vezes para o mesmo filme. A formula era sem dúvida a melhor
maneira de propagar Elvis pelo mundo e continuou mesmo após décadas de sua morte, com incessantes
reprises na Sessão Da Tarde, da Rede Globo.
O grande problema entretanto, é
que talvez por ganância ou simples comodismo, os filmes de Presley começaram
gradativamente a perder seus valores de produção. Os cenários ficavam cada vez
mais pobres, os enredos mais absurdos e as canções, que deviam interagir com o
filme, ficavam cada vez mais banais.
Enquanto filmes como GI Blues e Blue Hawaii mostravam capricho nos cenários e até mesmo em certas músicas (como Shopping Around, GI Blues e Cant Help Falling In Love) os filmes vindouros denotaram um relaxamento evidente e inadmissível para um artista da grandeza de Presley.
É claro que essas canções eram
escritas com o propósito de integrar uma cena do filme e até mesmo explicar
determinada situação, fato que deve sempre ser levado em consideração quando se
trata deste período. O problema reside justamente na acentuada queda de padrões
ao qual essas composições foram submetidas. Películas como Harun Scarun, Girls
Girls Girls e Fun In Acapulco traziam composições medíocres como
Marguerita, The Bullfight Was A Lady e Song Of The
Shrimp. Outras dezenas de canções sofreram essa mesma
sina.
Devemos supor portanto, que o
legado de Presley no cinema deve ser visto como um vazio completo, um embaraço
pelo qual os fãs de Elvis passam e um período no qual nada de produtivo foi
feito?
Parcialmente. Embora os “anos de
Hollywood” tenham em boa parte manchado seu legado e principalmente tomado um
tempo criativo que poderia ter sido empregado em vôos mais altos, os filmes de
Elvis cumpriram seu papel como agentes propagadores e principalmente, produziram
um punhado de canções que por si só trazem um enorme contribuição à esse período
conturbado. Canções como Let Yourself Go, Follow That Dream,
Bossa Nova Baby, I Got Lucky, Return To Sender,
One Broke Heart For Sale, They Remind Me Too Much Of You e
tantas outras, asseguram a esse período um alento muito necessário. Peças como
Viva Las Vegas e Cant Help Falling In Love tornaram-se quase
tão emblemáticas como Suspicious Minds e Love Me
Tender.
Há de se levar em conta, sendo de
suma importância, que tais filmes seguiam um padrão de comédia musical muito em
voga em sua época, e adotado por ícones como Sinatra. Até mesmo os Beatles se
arriscaram em obras do tipo em Help e A Hard´s Day Night.
Blue Hawaii inauguraria a
tendência dos “Beach Movies”, gênero que explodiria musicalmente com o
surgimento de várias bandas.
Sendo assim, nada resume tão bem
esse período de sua carreira, quanto as palavras de Susan Doll,
Ph.D:
“ Os filmes de Elvis são
provavelmente os filmes de maior sucesso do gênero adolescente musical...As
mudanças feitas em sua carreira eram necessária para que Elvis expandisse sua
popularidade e continuasse como uma força considerável no mercado. Quando
colocados dentro do seu contexto histórico, os filmes de Elvis não mais
representam um declínio de uma força musical e sim um reflexo do modismo,
costumes e fixações de uma época.”